sábado, 19 de janeiro de 2013

Conversa de circunstância em tempos de crise



A conversa de circunstância já não é o que era desde que começou a crise. Até aqui, a resposta para a pergunta "como vai a vida?" dependia do pessimismo ou otimismo do destinatário. O mais otimistista, mesmo que tivesse sido operado a uma hérnia uns minutos antes, diria que a vida vai bem. O mais pessimista, acabado de ganhar o Euromilhões, lá soltaria um "vai-se andando" enquanto franzia a testa com ar resignado.

A vida para os otimistas é hoje mais complicada. Ponto prévio: eu sou um otimista de circunstância e a vida corre-me bem.

No outro dia, no elevador, dou de caras com uns vizinhos mais velhos e com ar sério, como aliás deve ser qualquer solene encontro de condóminos no meio de transporte por eles mais utilizado.

"Como vai a vida", pergunta a senhora um andar e meio depois do início da viagem, após uma troca de sorrisos típica de quem não tem o que dizer.

"Bem...", respondo, hesitando. E penso se será esta a melhor forma de retorquir em tempo de crise. Tenho meio andar para pensar como me vou safar, para que não pensem que ignoro o sofrimento de todos os que são afetados pela crise e não podem, por imperativo categórico, dizer que está tudo bem.

"... quer dizer, isto agora está complicado...", acrescento.

Estou quase a chegar à minha paragem, a reação foi de aprovação em relação à qualificação da coisa como complicada, mas volto a pensar que estou bem.

"... quer dizer, eu não me posso queixar", finalizo.

"Olha que maravilha! É tão bom ouvir alguém que não se lamenta", afirma a senhora, sorrindo.

Chega a minha paragem, prendo a porta do elevador para ainda sorrir de volta e sigo refletindo no impacto da crise na conversa de circunstância.

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